• Em Unidade Estamos!

    “Verdadeiramente, é pela Graça de Deus que o conhecimento da Unidade surge dentro. Então o homem é por fim libertado do medo profundo da vida e da morte. Aquele Deus que brilha dentro de tudo, que é sem forma como o céu sem nuvens, é o puro, imaculado, Ser de todos. Sem qualquer dúvida, esse é quem Eu Sou”
    (Dattatreya – A Canção do Avadhuta)

  • Família – Um campo de Florescimento do Ser

    Muito do que chamamos de família nasce pelos vínculos de sangue, por papéis definidos e por histórias compartilhadas ao longo da vida. Mas, à medida que a consciência amadurece, percebemos que a família é mais do que conexões biológicas ou mesmo cármicas — ela é um campo de experiências onde o amor aprende, lentamente, a ganhar forma.

    Talvez a família se assemelhe a uma árvore antiga. Suas raízes não escolhem o solo; adaptam-se a ele. Crescem entre pedras, enfrentam secas, ventos contrários e estações rigorosas. Ainda assim, é justamente essa resistência silenciosa que lhe dá profundidade, firmeza e permanência. O que a sustenta não é a ausência de adversidades, mas a capacidade de atravessá-las.

    É nesse espaço que se manifesta a multiplicidade da vida. Diferentes visões de mundo, sensibilidades, pensamentos e emoções convivem — muitas vezes em contraste. A família se apresenta, então, como uma oportunidade contínua de aprendizado: ajuda mútua, amadurecimento emocional e expansão da consciência. Quando compreendida assim, ela deixa de ser apenas uma estrutura social e passa a se revelar como um ambiente pedagógico da existência.

    Nesse campo, somos chamados a respeitar as individualidades. Aprendemos que viver em relação não significa anular-se nem impor-se, mas pensar, sentir e agir considerando o bem comum. A família expõe fragilidades, ativa feridas antigas, testa limites, ensina sobre o perdão; e, exatamente por isso, torna-se um dos principais caminhos de reequilíbrio, reconciliação interna e, muitas vezes, redenção. A vida raramente oferece oportunidades de transformação tão diretas quanto aquelas que surgem no seio familiar.

    Com o tempo, algo mais sutil começa a se revelar. Quando deixamos de nos identificar exclusivamente com a forma — o corpo, o nome, a história pessoal, aquilo que nasce e se deteriora — e passamos a nos reconhecer como um Eu Superior, percebemos no outro a mesma essência divina. É nesse reconhecimento silencioso que surgem os vínculos mais profundos: relacionamentos que não se sustentam em necessidade ou conveniência, mas em afinidade espiritual, como galhos que se inclinam uns aos outros para buscar a mesma luz.

    Assim, a família se amplia. Amizades verdadeiras, companheiros de jornada, encontros que sustentam e transformam passam a integrar nosso mundo afetivo. Formam-se, então, campos de consciência compartilhada — uma família que não se escolheu pelo sangue, mas pelo reconhecimento mútuo do essencial.

    Cecília Meireles exprime essa verdade com delicadeza ao escrever:

    “Não digas: este que me deu o corpo é meu pai.
    Não digas: esta que me deu o corpo é minha mãe.
    Muito mais do que teu pai e tua mãe
    foram os que te fizeram em espírito.”

    Esses versos nos lembram de que somos formados, sobretudo, por aquilo que nos toca em profundidade: os encontros que nos educam interiormente e dão rumos ao caráter, as relações que nos despertam, os vínculos que nos ajudam a sermos mais verdadeiros.

    Talvez aí resida um dos maiores ensinamentos da família — em todas as suas formas: compreender que não estamos aqui apenas para satisfazer desejos individuais, mas para aprender a coexistir em unidade, reconhecendo no outro não uma ameaça ou um limite, mas um espelho do mesmo princípio vital que nos anima.

    Quando assim compreendida, a família deixa de ser apenas ponto de partida e passa a ser um espaço vivo de evolução. Mesmo entre ondas, conflitos e desafios, algo além das aparências une as contas do mesmo colar. Como a árvore que resiste ao tempo, é nesse campo silencioso — onde o essencial se reconhece — que o amor, pouco a pouco, cria raízes, se expande e aprende a florescer.

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